O meu
exemplar de “Cinema Cubano – Revolução e Política Cultural” (Mariana Villaça/
2010), acabou de chegar. Enquanto ainda encontro meios de começá-lo com a voracidade
de um aprendiz em Cinema, registro aqui umas palavras sobre um clássico do
Cinema Cubano: “Fresa y Chocolate”, uma produção da dupla Alea-Tabio de 1994.
O filme é uma
produção internacional realizada com apoio de Institutos Cinematográficos de
México, Espanha e o ICAIC - Instituto de Arte e Indústria Cinematográficos de Cuba.
Além disso, vale destacar que a produção executiva também é assinada pela
Miramax e Robert Redford, ator que criou o Festival de Sundance, que desde 1978
tem contribuído para dar visibilidade à produções independentes de diferentes
regiões do mundo.
Destaco inicialmente
estes aspectos porque o ICAIC foi a primeira medida de Política Cultural
adotada pela Revolução Cubana sendo criado já em 1961, tendo como objetivos
claros o comando da máquina cinematográfica a fim de se produzir, digamos, uma ‘consciência
social revolucionária e positiva’. Porém, apesar disso, o filme consegue imprimir
em seu roteiro um olhar cosmopolita, ou seja, ele traz em sua narrativa um olhar
crítico, esclarecedor acerca daquela realidade cubana vivida pelas personagens,
especialmente por Diego, homossexual representado impecavelmente por Jorge
Perrugoria.
Uma sinopse
que pode ser feita é a seguinte: Davi vacila sexualmente com sua namorada. Então,
sabemos que ela se casa com outro homem, enquanto Davi, solitário, passa a ser
assediado por Diego, um homossexual cosmopolita que tem em sua casa um
significativo acervo literário, artístico (e até mesmo etílico!) que demonstra
sua postura subversiva frente ao Regime Castrista. A partir deste momento,
acompanhamos a amizade de ambos.
Particularmente,
admiro o desenvolvimento da ambigüidade da questão de gêneros em sua narrativa.
Primeiro, temos que levar em consideração que o filme transita entre a comédia
e o drama. E aqui seria importante relevar as contribuições teóricas do próprio
Tomás Alea em seu “Dialética do Espectador”, (Summus Editorial, BRA/ 1984),
quando traduz Brecht em seu trabalho apontando que “para provocar o espectador é preciso, como condição primeira, que no
espetáculo se questione a realidade, se exprimam e se transmitam inquietações,
se façam interrogações. Isto é, é preciso um ‘espetáculo aberto’”. Assim, o
que vemos ao longo do filme é um esclarecimento sobre os dramas reais de
personagens cubanas factíveis que nos convidam para participar de suas
expectativas, sonhos e esperanças, afinal Davi ainda sonha com a mulher amada,
porém casada; daí que se deixar envolver com uma louca que tenta se suicidar a
todo momento por qualquer bobagem. E Diego, quando não sonha com um “american-way-of-life”
saboreando seu Red Label, desiste e quer fugir do país - um sonho recorrente já
registrado em outro excelente documentário “Balseros” (Bosch, 2002). Um outro
nível envolvendo os gêneros desta vez nos remete à sexualidade e a questão do
corpo como a própria expressão das contradições políticas vividas pelas personagens,
ou seja, o desejo é um elemento diegético que percorre todo o filme e nos
propõe insinuações acerca dos rumos daquelas vidas. Afinal, Diego se vale com
integridade de sua condição homossexual para expor as mazelas do Regime
Socialista. Por sua vez, é interessante ver que, à medida que Davi se afasta da
Juventude Revolucionária, ele, também, aos poucos, ganha potência sexual.
O filme ainda
suscita considerações acerca de questões estéticas e até mesmo uma leitura a
respeito do embargo econômico imposto à ilha pelos EUA desde 1961. Mas estas
questões deixo para os próximos filmes “Lista de Espera”, de J.C. Tabio e “Balseros”,
já citado acima.
Realizado em
1994, imagino que esta co-produção entre México, Espanha e Cuba foi uma saída
para a sobrevivência do ICAIC naqueles tempos de crise dos regimes baseados nos
valores do socialismo real. Mas, além disso, considero o importante registrar a
coerência narrativa do roteiro e a força dramática dos atores em uma obra
íntegra produzida numa conjuntura intensa da História da América Latina.
Abraços!
Fábio Monteiro
Abraços!
Fábio Monteiro